segunda-feira, 29 de maio de 2017

Classe de gente frustrada e improdutiva que não se sabe comportar

Entravam habitualmente naquele restaurante. Inicialmente consumiam um menu reduzido, mas com o tempo e um pouco encostados à ideia que numa diária se pode consumir tudo pelo mesmo preço, tipo vale tudo, foram-se alargando. Testavam quase diariamente o dono do restaurante, incluindo algo novo no menu, pedindo uma segunda sopa, uma cerveja extra, um vinho, enfim... E aquele homem que os atendia e que muitos dias era obrigado a fazer das tripas coração, tudo aguentava. Queria no mínimo manter o negócio; muitas vezes mesmo com prejuízo.

Um dia testaram a hipótese de partilhar um prato do dia e baseados na tal teoria, pediram uma sopa em dois pratos, para as duas pessoas... Esticavam a corda. O atendimento mantinha-se e aquele homem, mais culto do que eles, apesar dos "canudos" que ostentavam, "dava a outra face". E ao mesmo tempo aguentava a pressão da mulher que na cozinha se revoltava com o que se passava na sala e o filho que apelidava aqueles clientes, que ele bem conhecia, com um nome muito feio que se dá a pessoas cuja vida é explorar outras que trabalham em profissões pouco dignas.

Um dia a mesa era composta de cinco pessoas. Foram servidas quatro doses, sendo que uma era a tal da partilha. Essa partilhada era de salada de atum com feijão frade. Colocada a travessa na mesa, uma das pessoas (não as que iam partilhar) retirou uma azeitona da travessa com a mão, comeu-a e colocou o caroço numa beira da travessa; talvez porque lhe tivesse sabido bem e enquanto aguardava a chegada da sua dose, comeu uma segunda azeitona e repetiu a cena.
Servidas todas as doses, o pessoal começou a tirar a comida para os pratos. Subitamente o empregado de mesa foi chamado e deparou-se com uma reclamação. "Veja o que se passa na cozinha que esta travessa traz dois caroços de azeitona." Desesperado, sem saber como responder sem ferir a sensibilidade das pessoas, ele foi para trás e conferiu tudo. Naquele dia já haviam saído três doses do mesmo prato e as travessas encontravam-se, tal como haviam sido levantadas das mesas, no balcão da "copa suja". O sistema de "poka-yoke" que ele havia implementado e que consistia em ter num recipiente o número de componentes que precisava para as doses que se propunha fazer, garantindo que nada faltava e era colocada a quantidade certa, estava correcto. Tinha previsto quatro doses, haviam saído três mais a tal, o que dava precisamente quatro e o recipiente que tivera dezasseis azeitonas estava vazio. Numa tentativa de ver se a pessoa que havia consumido as azeitonas se acusava e limpava a imagem do estabelecimento, voltou à mesa e garantiu que o prato tinha trazido as quatro azeitonas, até porque a decoração era standard... Mas a pessoa não se acusou e exigiram a troca do prato, por outro diferente (carne)...

O homem apercebeu-se que uma das outras pessoas tinha ficado ruborizada e pensou que até final da refeição tivesse coragem para influenciar a pessoa que comeu as azeitonas a acusar-se. Mas não... Naquele dia o ambiente esteve pesado até eles abandonarem. E já depois de saírem, um outro cliente que havia presenciado a cena acalmou o homem que, chocado com a atitude deles, até a saliva lhe custava a engolir. Esse vira tudo, mas quando solicitado a testemunhar, somente para esclarecer, recusou-se: "Por favor não me envolva com essa gente"... Essa gente, foi como se referiu a eles...

O que mais me custa é que é nas mãos destas pessoas sem princípios que muitas vezes somos obrigados a confiar os nossos filhos para que os ensinem... Sim, ensinem... O quê?... Só mesmo as matérias técnicas, digo eu... E desde esse dia não mais voltaram a entrar naquele estabelecimento. A cozinheira acredita que tudo foi premeditado ou que, pelo menos, eles tenham descoberto e tido vergonha de voltarem... Aquele homem, o empregado, conhece tão bem as pessoas que não acredita que esses tenham vergonha de coisa alguma. O que aconteceu foi que Deus os afastou, não deixando que continuassem a humilhar o Seu povo, ou pelo menos a tentar...

Domingos António Cabral
Retalhos da minha vida

terça-feira, 16 de maio de 2017

O mais difícil é perdoar...

Gosto de ver a vida como um passeio, numa rua à beira mar. Nessa rua cruzamo-nos com muitas outras pessoas. Mas nem todas passeiam. Algumas passam por nós a um ritmo tão alto que quase não conseguimos vislumbrar os seus rostos de sofrimento. Outras passeiam, mas não desfrutam da paisagem; não valorizam o relaxamento que, ao perto, o bater das ondas na areia pode trazer ao nosso interior, nem a beleza estonteante do verde das serras, que lá ao longe, toca o nosso pensamento. Algumas focam-se nas pessoas com quem se cruzam para lhes lançar brita ou cascas de banana aos pés e desfrutarem de um prazer absurdo de ver os outros tropeçar, escorregar ou até cair.

É sobre este tipo de pessoas que eu hoje medito. Não compreendo o gozo que o sofrimento dos outros lhes dá. Principalmente porque, se alguém sofre ao meu lado, eu sinto tristeza e solidariedade; a única vontade que tenho é de ajudar e demonstrar o meu apoio e oro a Deus para que alivie esse fardo de quem sofre...

No entanto e a título de exemplo contar-vos-ei de seguida uma história verídica, que se passou há já 5 anos (mais ou menos).

Dois "amigos" entraram no meu estabelecimento numa noite em que não havia movimento algum; a casa estava vazia. Repararam que coloquei amigos entre aspas? Porque eles fingiam-se amigos um do outro; mas nas suas discussões jamais se apoiavam; guerreavam frequentemente por fazer prevalecer a sua opinião. E nas costas um do outro falavam mal e punham a descoberto a vida privada do seu opositor. Nessa noite eles permaneceram no estabelecimento das 22h00 às 02h00 do dia seguinte. Durante essas 4 horas consumiram somente 2 finos cada um. Eles viam que eu só aguardava a sua saída para encerrar o estabelecimento. O meu filho que na altura tinha uns 14 anos debatia-se com o sono. Sentamo-nos numa mesa e aguardamos que eles se dignassem sair, uma vez que já tinham parado de consumir. O Tiago acabou adormecendo sentado e com a cabeça pousada numa mesa. Um deles, que estava virado para o nosso lado ia fazendo o relato ao outro, que virava ligeiramente a cabeça e olhava de soslaio. De seguia sorriam um para o outro e continuavam na sua conversa sobre não sei o quê, que não os ouvia, mas devido a longas interrupções não devia ser muito importante. E só pelas 02h00 é que se levantaram, vieram pagar, pegaram na factura e saíram... Não eram pessoas incultas, porque um era professor do 3º e 4º ciclos e o outro um quadro técnico experiente, que por vezes viajava pelo mundo...

Felizmente no nosso passeio há pessoas que caminham ao nosso lado. Há pessoas que como nós se preocupam em ajudar e em ser solidários. Esse passeio, quando analisado em toda a sua extensão, não deixa de ter momentos de fraqueza em que precisamos de um ombro amigo ou de uma palavra encorajadora. Mas mesmo quando estou só, eu busco essa palavra nas Escrituras Sagradas. Eu procuro aí apoio para ultrapassar as pedras e as cascas que atiram para a minha frente. E como não basta ler e é preciso praticar, eu procuro perdoar como o Mestre mandou... Mas confesso que em algumas situações e principalmente quando mexe com o meu filho é mesmo muito difícil...

Domingos António Cabral
Retalhos da minha vida

quinta-feira, 2 de março de 2017

Os falsos foliões

Carnaval diz-se que é tempo de folia e divertimento. Apregoado pela comunicação social que assim estimula estas festividades. Desfiles no domingo anterior e no próprio dia de carnaval celebram o mundo carnal. Mais grave, celebram muitas vezes o deboche e o excesso. Mais recentemente vemos nesses desfiles autênticos cultos ao diabo e à morte. Curiosamente as pessoas apelidam esses desfiles de celebração da vida.

Eram cerca das 03h00 da madrugada, regressava a casa depois de ter estado a trabalhar, porque em 32 anos na actual terra em que o carnaval é famoso, nunca o festejei e nunca assisti aos desfiles do corso. Embora muitos que me conhecem me critiquem, eu só me preocupo com o meu comportamento perante Aquele que ninguém engana, porque lê os nossos corações. Mas regressava a casa e o que conseguia ver nas ruas eram pessoas aos gritos com bebidas alcoólicas na mão; pessoas que desfilavam com trajes mais rebuscados ou simplesmente improvisados, mas com o seu semblante sério, infeliz, por vezes mesmo zangado; pessoas caídas nos passeios, perdidas de bêbadas e já sem qualquer controlo sobre si mesmo e sobre as suas funções racionais (por vezes acompanhados dos "amigos" que se riam deles... e coloquei amigos entre aspas...).

Pensei comigo mesmo se aquilo era de facto alegria e folia, ou se não seria mais o cumprir uma tradição pagã, entregando-se por inteiro a práticas lamentáveis e reprováveis em termos sociais, já nem falo religiosas. Não consegui ver alegria em ninguém. Vi actores a desfilarem. Vi cultos esquisitos e demoníacos. Vi perda de dignidade. Vi homens pintados e vestidos como mulheres e mulheres vestidas de homens com bigodes postiços. Vi pessoas a cultuarem tudo menos a vida digna e alegre. 

E senti-me um estranho. Sei que mesmo estas linhas que hoje escrevo receberão mais reprovação do que aprovação. Mas fico feliz por, apesar de todas as dificuldades na minha vida, sentir que não faço parte deste mundo e recordo as palavras do meu Mestre:

"Se o mundo vos odeia, sabei que, antes de vós, odiou a mim. Se fôsseis do mundo, ele vos amaria como se pertencêsseis a ele. Entretanto, não sois propriedade do mundo; mas Eu vos escolhi e vos libertei do mundo; por essa razão, o mundo vos odeia." (Palavras de Jesus) Evangelho de João 15:18.19

Domingos António Cabral
Retalhos da minha vida

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Na semana passada as provações continuaram...

Eu sempre senti que quanto mais falo das Escrituras a mensagem delas se torna mais visível, mais clara, aos meus olhos e ao meu entendimento.
Na quinta-feira passada estive quase uma hora a falar das Boas Novas de Jesus e a explicar pormenores das Sagradas Escrituras. Foi um tempo edificante. Mesmo quando explicamos a alguém, algo que dominamos, nós continuamos também a aprender. Sentimos a nossa fé firmar-se.

Claro que há uma entidade a quem não agrada esta nossa postura. Fica chateado com o nosso crescimento espiritual e furioso por o rejeitarmos e seguirmos o nosso querido Mestre, Jesus. Estava a referir-me ao "inimigo", aquele que conhece Deus e que sabe que está condenado, que quando Jesus vier o seu reinado irá terminar de vez. Então tudo faz para nos abalar. E na passada quinta-feira, final do dia, ia eu tranquilamente numa ciclovia quando um automobilista, alegando que não me viu, atravessou a sua viatura à minha frente e eu não o conseguindo evitar, acabei a bater com a cara no chão. Sangrei muito, mas muito menos que Jesus. Sofri um bocado, mas nada que se compare ao que o Mestre sofreu. E no final, horas depois e depois de um TAC à cabeça, umas radiografias ao nariz e uma ida ao Otorrinolaringologista, nada tinha partido; somente alguns hematomas.

Uma conversa com o meu Pastor e Guia Espiritual e um pouco de reflexão sobre o assunto e ficou claro para mim que o inimigo magoa, mas Deus coloca a sua mão e quando não evita, ameniza o nosso sofrimento. E esses momentos que tantas vezes gostaríamos de evitar, acabam por ter um papel muito importante na consolidação da nossa fé. Nesse mesmo dia, no meu quarto, eu gritei bem alto com Satanás e disse-lhe que não levaria a melhor e orei ao meu Jesus, louvei-O, exaltei-O e agradeci-Lhe o estar sempre comigo.

No domingo fui solicitado para ler uma Palavra das Escrituras Sagradas e fazer uma oração. Li o Salmos 117, porque é uma exortação a todos para louvarem o Senhor e porque testifica a fidelidade do nosso Deus (o Único Verdadeiro) para com o seu povo. Depois durante a oração, a emoção embargou-me as palavras e tive que fazer uma pausa e reordenar os meus pensamentos. De regresso ao meu lugar, a emoção fez-me chorar. Sentei-me e chorei de alegria por sentir as minhas forças renovadas pelo meu Deus... E acredito que aquele irmão que me chamou para orar, agiu por acção do Espírito Santo, porque eu precisava desse choque para me desprender de vez desse acontecimento e seguir em frente.

Domingos António Cabral
Retalhos da minha vida

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Tive sede... E voltei a ter sede...

Na minha infância andei na catequese, mas pouco ou nada me ficou desse tempo. Por volta dos dez anos de idade e até aos quinze ajudava à missa. Nas leituras o padre lia excertos dos Evangelhos e eu das Epístolas. Achava aquilo uma enorme injustiça, o que eu mais gostava não era lido por mim. De qualquer das formas, os excertos dos Evangelhos deixavam-me sempre vontade de saber mais. Um dia questionei o padre, que me respondeu: "Se sentes vontade de saber mais, tens que ler os textos sagrados na íntegra e interpretar tu mesmo. Começa pelos quatro Evangelhos do Novo Testamento; pelo Evangelho de João que nas publicações é o quarto. Se tiveres dúvidas procura a resposta no teu coração, mas se precisares de ajuda vem ter comigo."

Começou então o meu contacto com as Sagradas Escrituras. Li os quatro Evangelhos e o livro de Atos dos Apóstolos e gostei. Logo na primeira leitura do Evangelho de João, quando cheguei ao Capítulo 4, versículos 10 a 14, senti a minha sede a ser saciada.
Mas com o tempo afastei-me e experimentei outras bebidas. Estávamos nos anos pós-revolução e eu na minha adolescência. Procurava o meu caminho. Um caminho para a minha vida. E voltei a ter sede.

Voltei ao Novo Testamento e aos Evangelhos. Já os tinha lido, mas quis voltar ao princípio e desta deparei-me com João 14:6 "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida, ninguém vai ao Pai senão por mim." (Palavras de Jesus). Voltei a sentir a minha sede saciada e encontrei o meu caminho. Mas passado mais algum tempo dei comigo a atravessar o deserto. Novamente à procura do Caminho. E voltei a ter sede.

Li então os livros de Moisés e tentei perceber a Lei. Fiquei fascinado com a paciência de Jó. Não me imaginava capaz de tal e fiquei um admirador deste personagem. Alguns se admiraram eu ter ousado ler este livro tão cedo. Em Daniel percebi o que era de facto a Fé inabalável. Nos Salmos encontrei e ainda hoje encontro uma fonte de encorajamentos e formulas de louvor que não nos deixam esquecer a grandiosidade de Deus e a pequenez do ser humano imperfeito. Provérbios dão-nos o mote para o nosso comportamento e o Eclesiástico é para mim, a continuação de Provérbios de uma forma ainda mais estruturada e objectiva. E a minha sede voltou a ser saciada. Agora senti que o foi de uma forma mais profunda.

Mas como ser humano que sou, passei a minha vida (e continuo) a cair e a levantar-me. Passei a vida a encontrar-me com Deus e a abandoná-lo. A arrepender-me e a re-encontrá-lo. A pedir perdão e a cometer os mesmos erros. A acreditar que Deus entende e por isso me castiga, me deixa cair, me deixa sofrer, me deixa sem forças... E eu, eu na minha pequenez humana tantas vezes tenho vontade de desistir, desistir de tudo, até mesmo da vida...

Domingos António Cabral
Retalhos da minha vida

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Experiência complexa

Quinta-feira, 15 de Dezembro de 2016, 03h33 (madrugada).

A esta hora a casa estava silenciosa e toda a gente dormia. Como num dia qualquer tinha-me deitado um pouco cansado, mas tranquilo. Por volta dessa hora um pesadelo começou a tomar conta do meu sono.
"Estava na casa de banho do piso inferior, 1º andar, no poliban. Tomava um duche quando repentinamente a luminosidade decresceu, o ar começou a ficar pesado e irrespirável. Sentia-se no ar algo maligno, prestes a atacar-me, mas não conseguia ver nada nem ninguém. Quis fugir, mas senti-me empurrado e as minhas costas foram projetadas contra a parede. A presença de algo, de uma massa de ar que se predispunha a sufocar-me, fez-me ir buscar energias ao fundo do meu ser para dar um grito de defesa, de libertação... Primeiro um grito rouco, depois um grito bem audível em toda a casa."
Ao meu lado a minha mulher deu um salto e acendeu a luz e do quarto ao lado veio o meu filho ver o que se passava. Tranquilizei-os: "Está tudo bem,  foi um pesadelo..." E na minha mente só pedia ajuda a Deus e pedia-lhe que afastasse de mim aquele cálice. Confesso que fiquei assustado e com medo que o pesadelo voltasse. Mas graças a Deus não voltou e acabei por adormecer e descansar um pouco.

Sexta-feira, 23 de Dezembro de 2016, 10h10 (manhã de sol de inverno).

Um vírus de gripe estava a fustigar a minha casa desde o início da semana. Ainda não havíamos recorrido ao médico, mas fomos obrigados (eu e a minha mulher) a deixar de trabalhar desde quarta-feira, dia em que não tivemos forças para sair da cama. Em sete anos de atividade no atual negócio, era a primeira vez que não abríamos por doença. A minha situação era a mais complicada. A minha mulher pressionava-me para ir ao médico e eu anuí... Primeiro decidi tomar um duche, pois o estado gripal havia-me feito transpirar bastante. Entrei na casa de banho do 1º andar, no poliban, e abri a água quente. Quando a temperatura da água estabilizou, meti-me debaixo do chuveiro. Mas comecei a sentir-me mal. Vómitos, tonturas, um mau estar crescente... De repente pareceu-me ver a luz diminuir e senti os meus pulmões com dificuldade em respirar. O ar parecia rarefeito e eu precisava de oxigénio. Uma enorme pressão tomava conta da minha cabeça. Por momentos não sabia o que fazer. De repente fechei a água, gritei pela minha mulher e saí do poliban. Quando a vi à minha frente, só tive tempo de lançar os meus braços à volta do seu pescoço... Estava a desfalecer e sentia a vida a escorrer de dentro de mim... Ela conseguiu sentar-me na sanita que se encontrava com a tampa fechada e chamou pelo Tiago... Eu já não estava dentro do meu corpo físico. Via-me desfalecido e a começar a dissolver-me... A casa de banho tem menos de 2 metros de largura, mas a cerca de 6 metros de distância estava um homem magro, vestido de preto, cabelo curto também preto. Olhava-me fixamente. Embora ciente que da minha boca não saía qualquer som, repetia a frase "Pai ajuda-me." Pedia ajuda a Deus. Não sabia o que se estava a passar, mas sabia que só Ele me podia ajudar. E cada vez mais sentia a vida material a afastar-se. Tinha a sensação que mais minuto menos minuto o meu corpo progressivamente se desintegraria ou diluiria e desapareceria no chão... A imagem do homem continuava igual, mas maior, estava agora a menos de 1 metro de mim. Subitamente pedi "Jesus salva-me." E eu não estava a pedir para não fazer a transição que começava a ficar cada vez mais evidente. Eu só queria que Jesus me salvasse, me recebesse no seu Reino. E ouvi então uma voz (só eu ouvi) que disse claramente, com poder, com força, com determinação "NÃO!" De repente senti-me regressar ao meu corpo físico. Recuperei os sentidos e ainda ouvi a minha mulher a dizer ao meu filho: "Liga para o 112." Eu tinha a certeza que o 112, o socorro do Instituto Nacional de Emergência Médica, jamais chegaria a tempo... Repeti a palavra "NÃO" que havia ouvido e pedi água com açúcar. Ela hesitou em me largar, mas eu disse que o podia fazer, pois sentia que Jesus me segurava nesse momento. Ainda com os olhos fechados dei o primeiro golo e retive um pouco a água debaixo da língua. Sabia que assim o açúcar seria mais rapidamente absorvido pelo meu organismo. Comecei a sentir gotículas de suor na minha testa. Rapidamente se espalharam ao resto corpo e comecei a transpirar. Aquele suor era o meu corpo a voltar à vida. Tomei mais água com açúcar e a primeira coisa que me ocorreu foi dizer. "Obrigado Senhor, que se faça a Tua vontade e não a minha". E na minha mente estava claro que me estava a ser dada uma missão que tinha de cumprir, porque para isso fui devolvido a esta vida, que mais não é do que uma passagem para o outro lado, onde tudo será diferente.

E ainda aqui estou hoje. Até quando Deus quiser. À procura de concluir a missão que Ele tem para mim; convicto que tenho de dar testemunho das suas Boas Novas.

Domingos António Cabral
Retalhos da minha vida