terça-feira, 30 de outubro de 2012

Onde andais, meus ideais?...

Nasci no Porto, em casa, perto do Carvalhido... Estudei na Escola Industrial do Infante D. Henrique, onde tirei o Curso Complementar de Electrotecnia.

Considero muito marcantes os tempos da minha adolescência... Vivi o 25 de Abril de 1974... Passei pelo 26 de Abril de 1974... Vibrei com o 25 de Novembro de 1975... Nunca me liguei a um partido político até porque as condições económicas familiares não me permitiam despender da verba das quotas mensais. Hoje arrependo-me, com um pouco mais de sacrifício tê-las-ia pago e talvez não tivesse tido que trabalhar tanto durante estes anos e ter enfrentado o desemprego em 2009.

Fui um apoiante incondicional daqueles que considero os dois maiores políticos e maiores lideres partidários do pós 25 de Abril, Francisco Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa, sempre comungando da convicção de Sá Carneiro que o PSD (como ele já então queria que o PPD se chamasse) era um partido de esquerda (tal como o SPD da Alemanha). Sá Carneiro sonhava com um PSD membro da Internacional Socialista... A primeira AD, a verdadeira, a autentica, foi uma revolução democrática dentro da política portuguesa da altura... A única discordância que tive com Sá Carneiro foi a escolha de Soares Carneiro para candidato a Presidente da República; nessa altura, com um candidato civil, o PPD/PSD, o CDS e o PPM tinham continuado a fazer história... A integridade destes políticos de então, coisa rara já nesse tempo, levou a que fossem assassinados, para que Portugal continuasse servil aos interesses imperialistas do poder económico. Veja-se como Durão Barroso se vergou perante o Presidente Bush dos EUA, aquando da segunda invasão do Iraque, que encoberta pela mentira das armas de destruição massiva, serviu somente para consolidar o controlo petrolifero do Iraque pelas empresas americanas...

Hoje sinto-me muito à esquerda não só do actual PSD, mas também do próprio PS (ao longo dos anos, também este deslizou para a direita).

Trabalhei 27 anos numa multinacional... Dedicação, luta, sacrifícos muito raramente reconhecidos, apesar de a maior parte dos Directores Gerais terem sido portugueses. A Multinacional decidiu fechar em Portugal, deslocalizando a linha de negócio para a China... Por questões estratégicas e economia de massas diz o comunicado oficial... Por questões de má gestão a nível do Grupo, em que os activos em todo o mundo estão a ser vendidos para apresentar resultados positivos aos accionistas, digo eu... Isto enquanto durarem, porque depois restará vender a marca a um dos gigantes Asiáticos. E até já assistimos a uma tentativa de vender a marca no mercado de Televisão, só que a desvalorização e desgaste que a mesma sofreu, não foi suficientemente convincente para a empresa Chinesa interessada...

Olho para o meu país e tenho dificuldade em reconhecer actualmente os ideais da minha juventude. Cada vez há mais pobreza, mais desemprego, mais tristeza... "O que nós queremos é que os pobres sejam menos pobres" era então o nosso slogan. O que os políticos de agora querem é que os ricos sejam mais ricos... E a igualdade que defendi quando adolescente cada vez existe menos... Os professores, que desfilam aliados a partidos que se dizem de esquerda, voltaram a implementar, nas escolas, as entradas separadas dos alunos... Os líderes dos grandes partidos políticos têm que ser Doutores ou Engenheiros, nem que seja à força; e já ninguém fala em lideres populares como Lech Walesa, eles foram absorvidos pelo sistema... Os gestores ganham prémios astronómicos por levarem as empresas à falência; assinam cheques e contratos de milhões de Euros sem se preocuparem com as consequências do que fazem... Os grandes partidos, aqueles que alternam na governação, protegem-se mutuamente e alternam os cargos políticos com os das empresas públicas... Revejo em tudo isto a cena final do livro "Animal Farm" ("Triunfo dos porcos" na tradução portuguesa) de George Orwell...

Estou a escrever esta nota e não sei se uma noite destas estacionará à minha porta uma carrinha preta e virão cá dentro, uns homens de escuro, de chapéu e gabardine, buscar-me para "interrogatório"... É que às vezes tenho a sensação que já faltou mais tempo para que isso volte a acontecer... Estes que agoram ocupam os lugares do poder, só usam o governo e os partidos para fazer o país retroceder mais de 40 anos...

PS: Se ainda alguém ficou com dúvidas, declaro solenemente que não apoio nenhum partido... Aliás prefiro morrer a ser apontado como político, porque neste momento, ser político é sinónimo de mentiroso e sem escrúpulos, para não dizer algo mais forte... E piores dias se avizinham...

Domingos António Cabral
Retalhos da minha vida